-Trata-se do CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA - não tente misturar com debates de política de internet.
-Você não manda em ninguém a não ser por força de lei. O paciente tem autonomia, você goste ou não.
-Você DEVE sugerir o que julgar melhor para seu paciente de acordo com seu conhecimento e experiênica, por motivos éticos.
-Lembre que, caso fosse possível você proibir ou permitir algo, você seria responsável pelos desfechos, então fique feliz por não ter esse poder nem a responsabilidade que vem com ele.
- Claro que, em situações em que a ação do paciente seja danosa à sua autonomia, você deve comunicar seus limites e tomar as providências normais para garanti-la. Você também pode comunicar o paciente sobre regras administrativas do ambiente onde se encontram e tomar medidas previstas pela administração caso sejam violadas as regras. Caso o paciente expresse antecipadamente que tomará determinada atitude com a qual você não concorda, seu relacionamento poderá ficar prejudicado e, exceto em situações de urgência/emergência, você pode até mesmo ter que encaminha-lo a outro profissional.
Tudo isso esclarecido, vamos à abordagem esperada:
Nem eu, nem você, nem nenhum ser humano vivo conhecido é capaz de prever o futuro. Nós somos capazes, porém, de prever riscos condicionais relacionados à saúde em vários contextos.
Examplo prático 1: proibir dirigir no dia em que recebeu anestesia
Você sabe que um paciente pode ter prejuízo variável e flutuante após receber uma anestesia/sedação para um procedimento médico (endoscopia, cirurgia, etc.). Espera-se, conforme o próprio CFM sugere, que você recomende ao paciente que vai para casa no mesmo dia da anestesia, que este volte com acompanhante maior de idade e que o paciente não seja o motorista naquele dia.
Você até pode se recusar a realizar a anestesia caso o paciente diga que não seguirá suas recomendações, sejam quais for, por falta de acordo entre as partes ANTES da realização do serviço. Você até pode proferir palavras como "você está proibido de dirigir para casa hoje", mas isso não tem qualquer efeito legal caso ele desobeceça, caso parem no caminho e ele passe a ser motorista, algo impossível de você verificar. Se ele desobedecer, não será multado, não vai acontecer literalmente nada com ele a não ser o dano físico caso isso resulte em acidente. Se você trocasse a frase por "recomendo que você não dirija hoje", o efeito final é o mesmo.
Exemplo prático 2: paciente pergunta se poderá voar de avião um dia após a cirurgia
Vamos ser sinceros: não temos ensaios clínicos e nem mesmo bons estudos observacionais sobre esse assunto. No máximo, vamos tentar adivinhar o fururo usando raciocínio inferencial (aquele que normalmente é invalidado após os ensaios clínicos). Caso você proiba ou sugira não viajar e o paciente desobedeça, o resultado será o mesmo que no exemplo anterior: nada acontecerá com ele a não ser as consequências de seu próprio ato, que variam de nada a complicações.
Como fazer certo
Conheça riscos e benefícios
Caso tenha tempo, pesquise no uptodate, pesquise artigos, pergunte a amigos.. junte o máximo possível de conhecimento sobre os riscos principalmente (pois os benefícios o paciente já sabe ou nem iria pedir). Se possível, anote até o tamanho do efeito dos riscos (p.ex: há um risco de 1% de mortes caso dirija para casa após uma sedação para endoscopia - obs: esse número não é verdadeiro). Seja sincero, fale sua experiência, fale o que você sabe (até agora opiniões de especialista) e fale o que você viu na literatura e então dê suas sugestões. Grave sua consulta ou registre as recomendações em prontuário e entregue por escrito.
E se o paciente quiser resposta direta, posso ou não?
Seja sincero novamente, use frases como "Acho que você não deve, mas não sou juiz, não tenho poder sobre você, você pode fazer o que quiser pois tem direito legal à autonomia. Se quer apenas minha OPINIÃO sobre sim ou não, minha OPINIÃO é não.", etc. Nunca caia na cilada de tornar-se co-responsável por algo que é responsabilidade dos atos paciente e do universo, que você não controla.